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Monday, May 01, 2006

Crepes ou panquecas...

Com disposição para encarar todo tipo de companhia, as crêpes jamais saem de moda. Doces, salgadas, quentes, geladas, grandes, em tamanho miniatura, dobradas, enroladas, abertas ou sobrepostas, têm lugar do início ao fim da refeição, em parceria com os mais variados recheios: picados, desfiados, pastosos, cremosos. Exatamente por isso, conseguem o prodígio de surpreender, mesmo depois de tantos séculos em cartaz. Sua origem é controversa, porém, seja qual for a versão que tomemos como verdadeira, não há dúvida: a receita é antiqüíssima. O nome em francês, crêpe, deriva do termo crispus, em latim, que significa crespo. Refere-se à textura encrespada que a finíssima massa, feita com farinha, ovos, leite e água, adquire durante a rápida passagem pela frigideira untada com manteiga. Em italiano, são chamadas de crespelle, pelo mesmo motivo.Originalmente, eram assadas em pedra quente, e mais tarde passaram a ser preparadas em chapa redonda de ferro sobre o fogo. Há indícios de que suas raízes estejam no pão indiano chapati e nas panquecas chinesas. Mas os primeiros registros de crêpes foram feitos no século I, pelo gastrônomo romano Apicius, autor do receituário De re coquinaria. Ali se descobre que já naquele tempo as panquecas eram feitas com a mistura de leite, água, ovos e um pouco de farinha. Cozidas no ferro quente, iam à mesa com mel e pimenta, de acordo com The Oxford Companion to Food (Alan Davidson, Oxford). Acredita-se que existiam bem antes de Apicius e gozavam de certa popularidade. Entretanto, os italianos defendem que a especialidade nasceu quatro séculos mais tarde - sem ter água entre os ingredientes. Tal versão, religiosa, figura na Grande Enciclopedia Illustrata della Gastronomia (Selezione dal Reader's Digest, Milão, 2000). No século V, peregrinos franceses compareceram em peso a Roma para a Festa della Canderola. Chegaram cansados e famintos, porém movidos pela fé. O papa Gelasio, empenhado em recebê-los bem, ordenou que a cozinha do palácio pontifício fosse abastecida com tantos ovos, sacos de farinha e litros de leite quanto fosse possível. As crêpes teriam nascido ali, ao acaso. Segundo essa história, os peregrinos saborearam a novidade e levaram a fórmula para a França. Os franceses, porém, garantem que a receita nasceu em sua pátria, mais exatamente na Bretanha, no oeste do país. A região pode não ser o berço das crêpes, mas é certamente o lugar que melhor as prepara. As incontáveis crêperies se espalham pelas cidades bretãs, impregnando o ar com um aroma doce e delicado. As finíssimas panquecas são habilmente feitas sobre chapas de metal. A receita doce combina farinha de trigo integral, ovos, leite e água, açúcar e baunilha. É servida com geléia, chocolate ou purê de maçã ácida, fruta abundante ali. A salgada, chamada de galette, é o prato de resistência no almoço bretão, acompanhada de leite desnatado, cerveja ou cidra. A massa salgada leva apenas trigo sarraceno, água e sal, de acordo com a belíssima publicação O Sabor da França (Robert Freson, Salamandra, 1983). O recheio pode ser ovo - colocado cru sobre a massa também crua -, bem como carne ou peixe. Tem sido apreciada dessa forma nos campos e nas cidades da região, há centenas de anos.No século XV, as panquecas se encontravam difundidas por toda a Europa. Um manuscrito culinário inglês datado de 1430 dá indicações de que eram bastante familiares na época. Na história das crêpes na Inglaterra, há uma curiosíssima passagem, registrada por Alan Davidson em seu The Oxford Companion to Food: a corrida das panquecas, um evento realizado desde 1445, na pequena cidade de Olney, em Buckinghamshire. Apenas donas-de-casa locais podiam participar da disputa. Tinham de fazer as panquecas com as próprias mãos - badaladas dos sinos da igreja davam início ao preparo das massas e, mais tarde, à largada da corrida. De avental, lenço ou chapéu na cabeça e frigideiras em punho, as senhoras da aldeia corriam por um trajeto de 380 metros com as panquecas na panela. Durante o percurso, precisavam atirar três vezes a massa para o alto e pegá-la de volta. O prêmio para tanto esforço proporcionava o caminho dos céus: um livro de oração.Por volta de 1600, os ingleses tinham o hábito de misturar vinho ou brandy à massa da panqueca. Cem anos mais tarde, haviam substituído a bebida por leite ou creme, alcançando melhores resultados. No século XVIII, a especialidade já representava um papel importante nas celebrações cristãs, em diversos países europeus. Com lugar garantido na mesa de Páscoa, também aparecia na noite de Quinta-Feira Santa: era o último prato consumido, antes do jejum da Sexta-Feira da Paixão. Na Holanda, além das crêpes, come-se na ocasião o waffle. Na Alemanha, ao contrário, os doughnuts anunciavam o jejum e as panquecas faziam a festa no domingo pascal.Com prestígio sempre em alta, novas maneiras de acompanhar as crêpes, doces ou salgadas, simples ou sofisticadas, foram surgindo em diferentes localidades. A mais célebre delas foi registrada pelo mestre francês da cozinha, Auguste Escoffier, em 1903, de acordo com The Oxford Companion to Food. A receita, uma combinação de panquecas e molho de laranja, flambados no restaurante à frente do cliente, teria sido uma invenção do chef francês Henri Charpentier, datada de 1896. Enquanto servia um jantar no Café Paris, em Monte Carlo, para o então príncipe Edward, de Gales, e uma acompanhante, ele fez a crêpe. Trouxe-a à mesa para flambar, perguntou o nome da acompanhante de sua majestade e batizou como ela a sobremesa que ganhou fama no mundo todo e, no início do século XX, virou sinônimo de luxo e sofisticação: crêpe Suzette. Em 1930, o lendário Charpentier mudou-se para os Estados Unidos e levou com ele a receita de sua famosa invenção, contribuindo, dessa maneira, para aumentar a variedade, já grande, de panquecas e receitas similares que chegaram ali junto com os conquistadores. Na América, as panquecas são conhecidas com diferentes nomes de origem holandesa, alemã ou inglesa, e preparadas com ingredientes que variam de farinha de arroz e de milho à farinha de trigo. Mais grossas e elásticas que as européias, têm diversos nomes, entre eles batter cakes, flapjacks ou hot cakes. São uma mania nacional. Mas, em vez de encerrar com elas as refeições, os americanos gostam é de começar o dia com as panquecas, quentinhas, acompanhadas de manteiga, geléia ou do xarope doce feito de seiva de uma espécie silvestre (herança dos índios), chamado maple syrup.

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